A ti, Senhor, que conheces os abismos da consciência humana, poderia
eu esconder algo, ainda que não quisesse confessar-te? Eu poderia
esconder-te de mim, mas nunca esconder-me de ti!
Agora que meu pranto demonstra quanto me desagrado a mim mesmo, tu
resplandeces a meus olhos me agradas, e és amável e desejável, a fim de
que eu me despreze e renuncie a mim mesmo para escolher-te a ti, e que
eu não agrade nem a mim nem a ti, senão por teu amor.
Portanto, Senhor, tu me conheces como sou, e eu já disse com que
finalidade me confesso a ti. É uma confissão feita, não com palavras e
com a voz do corpo, mas com o grito interior da alma e com o clamor do
pensamento, que teus ouvidos já conhecem.
Confessar o que fiz de mal significa o desgosto que tenho e mim
mesmo. Mas, quando confesso o bem que fiz, nada posso atribuir a mim
próprio, pois tu, Senhor, abençoas o justo, no entanto, foste tu que o
tornaste justo, de ímpio que era.
Assim, esta confissão diante de ti é, ao mesmo tempo, silenciosa e
não silenciosa. Cala-se a voz, grita a coração. Tudo o que digo aos
homens, tu já ouviste de mim; e de mim nada que tu mesmo não tenhas dito
antes.
Extraído do livro “Confissões” de Santo Agostinho
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