Naquele tempo, o anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da
Galileia, chamada Nazaré, a uma Virgem, prometida em
casamento a um homem chamado José....
Galileia, chamada Nazaré, a uma Virgem, prometida em
casamento a um homem chamado José....
Se
nos fosse dado contemplar a imensidade dos possíveis de Deus, ou seja, o
incontável número de seres que Ele poderia ter criado em
sua onipotência, veríamos criaturas semelhantes às deste mundo, mas sem
os seus característicos defeitos. Por exemplo, ouriços constituídos sem
meios de causar mal aos homens; pernilongos lindíssimos dotados de uma
picada agradável e benfazeja; urubus de figura tão elegante quanto os
seus voos, e assim por diante.
Por que não pôs Deus no universo criaturas assim, sem qualquer defeito, as quais poderiam ter sido criadas e não o foram?
Pergunta
esta de difícil resposta. O certo, porém, é que no universo no qual
vivemos três criaturas são insuperáveis: a humanidade de Nosso Senhor
Jesus Cristo, unida hipostaticamente à divindade; a visão beatífica e
Nossa Senhora.1 Todos os outros seres, considerados individualmente,
poderiam ser mais perfeitos.
Ora,
este mundo composto por criaturas com deficiências é, entretanto, ótimo
no seu conjunto, como ensina São Tomás de Aquino: "O universo não pode
ser melhor do que é, se o supomos como constituído pelas coisas atuais,
em razão da ordem muito apropriada atribuída às coisas por Deus e em que
consiste o bem do universo. Se apenas uma dessas coisas se tornasse
melhor, a proporção da ordem estaria destruída, como a melodia de uma
cítara ficaria destruída se uma corda se tornasse mais tensa do que
deve".2
O
universo criado por Deus tinha de ser o que mais O glorificasse, porque
Ele não poderia ter escolhido criá-lo de forma nem um pouco inferior ao
mais adequado. E tudo quanto nele existe de defectivo serve para o
homem ter presente a sua debilidade, fraqueza e dependência contínua de
Deus. Lembra-lhe, enfim, sua contingência. É deste mundo, com
deficiências, que nós fazemos parte.
As
considerações acima nos preparam para analisar o papel de Nossa Senhora
na Criação, que é especialmente recordado na liturgia escolhida pela
Igreja para a Solenidade da Anunciação do Senhor.
Sobre
a conhecidíssima e tão comentada passagem evangélica da Anunciação,
pareceria não haver nada de novo a dizer. Entretanto, como um vinho
excelente apresenta aspectos diferentes em cada safra, assim também
acontece com o magno acontecimento da Encarnação do Verbo, no qual
sempre descobriremos novas e magníficas maravilhas.
"Naquele
tempo, 26 o anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galileia,
chamada Nazaré, 27 a uma Virgem, prometida em casamento a um homem
chamado José. Ele era descendente de Davi e o nome da Virgem era Maria".
Antes
de entrar na análise da narração de São Lucas, é mister voltarmos nossa
atenção para o local onde Se encontrava Maria Santíssima ao ser
visitada pelo Arcanjo São Gabriel. Não se tratava de um magnífico
palácio, como tantos artistas imaginaram, mas de uma casa muito modesta,
com paredes de tijolos aparentes. Estava situada em Nazaré, uma cidade
então insignificante, na qual a Sagrada Família viverá na pobreza,
humildade e apagamento.
Não
há neste episódio outros elementos cujas aparências estejam à altura do
acontecimento que ali se daria, a não ser a presença da Virgem Maria, e
também a de São José. Pois o elevadíssimo grau de santidade de ambos
certamente transluzia em seus gestos, fisionomias e em todo o seu modo
de ser.
28a "O anjo entrou onde Ela estava...".
O
que fazia Maria Santíssima quando o anjo chegou junto a Ela? Sem
dúvida, rezava, talvez considerando a desastrosa situação na qual se
encontrava a humanidade. O povo judeu havia se desviado da prática da
verdadeira religião e os pagãos, a começar pelos romanos, viviam numa
tremenda decadência moral. Chegara-se ao que São Paulo chama "plenitude
dos tempos" (Ef 1, 10).
É
assim, com Maria Santíssima orando ao Pai recolhida no seu aposento,
que São Bernardo descreve a cena da Anunciação, pondo em realce a
importância da oração para Deus manifestar-Se. Pois uma coisa é
evidente: as preces d'Ela comoveram os Céus: "A saudação do anjo, feita
com tanta reverência, indica quanto as orações de Maria haviam agradado
ao Altíssimo"3 - afirma o Doutor Melífluo.
Numa
de suas meditações sobre a vida de Cristo, São Boaventura nos apresenta
a jovem Maria levantando-Se à meia noite no Templo para fazer sete
súplicas diante do Altar e rezando desta forma: "Eu Lhe pedia a graça de
presenciar o tempo no qual haveria de nascer aquela Virgem Santíssima
que daria à luz o Filho de Deus, de conservar-me os olhos para poder
vê-La, a língua para louvá-La, as mãos para servi-La, os pés para ir
aonde Ela mandar e os joelhos para adorar o Filho de Deus em seu
regaço".4
Sua
humildade A impedia de concluir quem haveria de ser essa Dama à qual
desejava ardentemente servir, mas, possuindo ciência infusa e recebendo
graças sobre graças, foi tecendo considerações até conceber em seu
espírito, com total nitidez, a figura moral do Messias prometido. Maria
"concebeu Cristo em sua mente antes de concebê-Lo em seu ventre", afirma
Santo Agostinho.5
Ao
ver iluminar-se o aposento por uma luz sobrenatural e aparecer diante
d'Ela o Arcanjo São Gabriel, Maria não deu o menor sinal de espanto.
Segundo vários autores, entre eles São Pedro Crisólogo e São Boaventura,
Ela estava "habituada às aparições angélicas, as quais não podiam
deixar de ser frequentes para Aquela que Deus havia cumulado de tantas
graças, que reservava para tão altos destinos, e que os anjos
reverenciavam como sua Rainha e a própria Mãe de Deus".6 Podemos,
inclusive, conjecturar que o próprio São Gabriel não Lhe fosse
desconhecido.
28b"... e disse: ‘Alegra-Te, cheia de graça, o Senhor está contigo!'".
A expressão usada pelo Anjo para saudá-La tem um sentido muito profundo no qual vale a pena nos determos.
Nosso
Senhor Jesus Cristo, Salvador da humanidade, é a única criatura que
possui a plenitude absoluta de graça. Ele a teve desde o início, sem
qualquer possibilidade de aumento. E quando o Evangelho afirma que Jesus
"ia crescendo em sabedoria, tamanho e graça diante de Deus e dos
homens" (Lc 2, 52), refere-se às manifestações exteriores de sua
santidade. "Mas interiormente o tesouro de dons celestes,que O tornavam
agradável a Deus, era tão perfeito que não podia crescer de maneira
alguma".7
Não
acontecia o mesmo com Nossa Senhora. Ao longo de toda a sua vida, foi
incessante seu progresso espiritual, ora devido aos méritos
sobrenaturais obtidos pela prática de incontáveis boas obras, ora como
fruto da sua oração humilde, confiante e perseverante, ora, no
fim da sua existência, por efeito do Sacramento da Eucaristia. E isto
sem falar dos incrementos de graça, de incalculáveis proporções,
experimentados por sua alma no momento da Encarnação do Verbo, aos pés
da Cruz e por ocasião de Pentecostes.8
Não
houve, portanto, um instante no qual Ela não tivesse mais graça do que
no anterior, como bem exprime Campana: "Em todos os momentos de sua
vida, Maria foi penetrada por inteiro pelos raios divinos da graça; em
cada minuto de sua existência, sua vontade mostrou-se dócil em render a
Deus homenagem e glória; todas as pulsações de seu Coração foram sempre
para Deus. [...] Essa ascensão de Maria rumo ao ideal de santidade era
contínua, uniforme, sem solavancos, sem interrupção".9
Assim,
quando o anjo A proclama "cheia de graça", indica estar sua alma
participando da vida divina no maior grau possível naquele instante; mas
um minuto depois essa plenitude já seria maior. E
conclui o mesmo Campana: "Maria progredia em graça porque n'Ela se
desdobravam sem cessar novas capacidades de graça, as quais eram logo
preenchidas. Precisamente nisto consiste a diferença característica
entre a plenitude de santidade de Maria e a de Jesus Cristo".10
Com
base no Doutor Angélico, Garrigou-Lagrange distingue três plenitudes de
graça: absoluta, exclusiva de Cristo; de superabundância, privilégio
especial de Maria; e de suficiência, comum a todos os santos.11 E
explica o insigne teólogo dominicano: "Essas três plenitudes
subordinadas foram justamente comparadas à de uma fonte inesgotável, à
do rio que dela procede e à dos canais alimentados por esse rio para
irrigar e fertilizar as regiões por ele atravessadas, ou seja, as
diversas partes da Igreja universal no espaço e no tempo".12
Assim,
desde o momento de sua criação, Maria Santíssima participou da vida
divina mais do que todos os Anjos e todos os bem-aventurados juntos. A
tal ponto, que se Ela lhes distribuísse todas as graças das quais cada
um deles tivesse necessidade, nada Lhe faltaria, pois, "sob a forma de
méritos, de orações e de sacrifícios, esse rio de graça remonta a Deus,
oceano da paz".13 A plenitude da graça de Maria, afirma São Lourenço de
Bríndisi, "só é compreensível para Deus, pois só Ele abarca o abismo
imenso e o quase infinito pélago dessa graça".14
29 "Maria ficou perturbada com essas palavras e começou a pensar qual seria o significado da saudação".
A reação de Nossa Senhora mostra a profundidade do seu espírito. Dotada
de ciência infusa, Ela entendeu perfeitamente o alcance da altíssima
afirmação do anjo, considerando não apenas o significado imediato
daquelas palavras, mas também suas consequências e correlações com o
panorama da História.
Contudo,
sendo cheia de graça, um dos seus predicados era a humildade mais
excelsa. Em nada preocupada consigo mesma, todas as suas cogitações
voltavam-se para Deus e a salvação da humanidade: Quando virá o Messias?
Quando se dará a redenção?
A
presença de São Gabriel não Lhe causou qualquer perturbação. Sua
saudação, porém, deixou-A com um ponto de interrogação, pois não podia
imaginar que aquelas palavras pudessem ser aplicadas a Ela. Conforme
esclarece São Tomás: "A Bem-aventurada Virgem tinha uma fé expressa na
Encarnação futura: mas, por ser humilde, não tinha tão alta ideia de Si
mesma. E por isso era preciso que fosse informada a respeito da
Encarnação".15
30 "O anjo, então, disse-Lhe: ‘Não tenhas medo, Maria, porque encontraste graça diante de Deus'".
Embora
sem mancha de pecado original, Nossa Senhora foi criada em estado de
prova e percebia com toda clareza a necessidade da vigilância. Temia
aplicar a Si as palavras do Anjo e, cedendo em algo ao orgulho, acabar
por ofender a Deus.
"Não
tenhas medo, Maria" significava: "Não vos preocupeis, porque vossa
humildade em nada será atingida". Com essas palavras, São Gabriel A
exorta a ter confiança de que jamais sairá do reto caminho. Não em razão
dos seus méritos. Ele não diz: "Não tenhas medo porque és forte", mas
sim "porque encontraste graça diante de Deus".
A
resposta, no-la dá São Bernardo: "Se Maria não fosse humilde, não
desceria sobre Ela o Espírito Santo; e, se Este não descesse, Ela não
conceberia pelo poder d'Ele. Pois como poderia conceber d'Ele sem Ele? É
claro, portanto, que, para Ela conceber d'Ele, ‘o Senhor olhou para a
humildade de sua serva' (Lc 1, 48) muito mais do que para a sua
virgindade; e, embora tenha por sua virgindade agradado a Deus, foi pela
humildade que concebeu".16
E
nós também procedemos assim? Tomamos cuidado com a vaidade, como o fez
Nossa Senhora nessa circunstância? Somos cientes de que um pensamento de
orgulho consentido pode ser o ponto de partida para uma séria
decadência na vida espiritual? Ou aceitamos com delícias qualquer
elogio, real ou imaginário, que nos seja feito? O
ato de virtude que Lúcifer e os anjos maus não praticaram no Céu, nem
Adão e Eva no Paraíso Terrestre, Maria Santíssima o fez da forma mais
perfeita possível. Que exemplo sublime Ela nos dá, a nós tantas vezes
preocupados em obter honrarias devidas ou indevidas!
31"Eis
que conceberás e darás à luz um filho, a quem porás o nome de Jesus. 32
Ele será grande, será chamado Filho do Altíssimo, e o Senhor Deus Lhe
dará o trono de seu pai Davi. 33 Ele reinará para sempre sobre os
descendentes de Jacó, e o seu reino não terá fim".
Nestes
três versículos, o Anjo indica as extraordinárias características
d'Aquele que Nossa Senhora haveria de conceber. Elas estavam em perfeita
harmonia com a Sagrada Escritura, a qual Maria Santíssima conhecia como
ninguém, e com a rica imagem do Messias formada por Ela em seu
espírito, ao longo dos anos.
Imaginemos
qual seria a reação de uma jovem recém-casada daquele tempo, ao receber
de um anjo a notícia de que o seu filho haveria de ser grande tanto na
ordem sobrenatural: "será chamado Filho do Altíssimo", quanto na
natural: "o Senhor Deus Lhe dará o trono de seu pai Davi". Impossível
excogitar algo mais elevado!
Maria,
entretanto, reage diante da comunicação do Anjo dando novas mostras de
humildade heroica. São Gabriel lhe anuncia que será a Mãe do mais
importante dos filhos de Israel: do próprio Messias! E Ela o ouve
tranquila e serena, porque as suas preocupações estavam bem longe da
glória pessoal.
34"Maria perguntou ao anjo: ‘Como acontecerá isso, se Eu não conheço homem algum?'".
Aqui
resplandece a Fé de todo incomum de Nossa Senhora, ante o anúncio feito
pelo Anjo. Ao ouvi-lo dizer "conceberás e darás à luz um
filho", reconhece tratar-se de fato de uma mensagem divina, e não põe
obstáculo algum à sua realização. Porém, entre as graças dasquais Ela
estava plena, reluzia um insuperável amor à virtude da castidade.
Desposada com São José, combinou com ele manterem-se virgens por toda a
vida.17 E é nesse sentido que se deve entender a expressão "não conheço
homem algum". Podemos supor ter havido longas conversas entre Ela e São
José a esse respeito, chegando à conclusão de ser claramente inspirado
por Deus o voto de castidade feito por ambos. Mesmo
com essa convicção bem arraigada na alma, Ela não duvidara das palavras
de São Gabriel. Apenas apresenta-lhe sua perplexidade, visando conhecer
mais a fundo como haveria de concretizar-se o desígnio divino.
35
"O anjo respondeu: ‘O Espírito virá sobre Ti, e o poder do Altíssimo Te
cobrirá com sua sombra. Por isso, o menino que vai nascer será chamado
Santo, Filho de Deus. 36 Também Isabel, tua parenta, concebeu um filho
na velhice. Este já é o sexto mês daquela que era considerada estéril,
37 porque para Deus nada é impossível'".
Quem
senão Deus, seu Criador, conhecia o amor extraordinário da Virgem
Santíssima à virtude da pureza? Por isso Ele, que é a Delicadeza em
essência, teve o cuidado de mandar o celeste mensageiro resolver com
extraordinária elevação e reverência sua santa perplexidade.
Conhecendo
por instrução divina o problema que a maternidade divina levantava
n'Ela, o anjo Lhe mostra que, assim como havia concedido à sua prima
Isabel conceber um filho na velhice, a Onipotência divina poderia
fazê-La conceber sem concurso de varão. E Ela, resplandecente de
sabedoria e inteligência, entende em toda a sua profundidade as
explicações do Anjo e logo as aceita.
A
origem inteiramente sobrenatural do Verbo Encarnado foi revelada
naquele momento. Que considerações não deve ter feito Maria ao conhecer o
alcance desse acontecimento! Maria gerou no tempo a mesma Pessoa gerada pelo Pai na eternidade
38 "Maria, então, disse: ‘Eis aqui a serva do Senhor; faça-se em Mim segundo a tua palavra!'. E o anjo retirou-se".
A
escravidão é o estado mais deplorável para uma criatura humana. Pelo
Direito Romano, quem caía nessa situação era considerado coisa, res,
perdendo todos os direitos próprios à pessoa humana. E quando a Virgem
Maria disse: "Eis aqui a serva do Senhor", o fez com total consciência,
colocando-Se por inteiro nas mãos de Deus, com absoluta confiança na sua
liberalidade.
A
partir desse ato de radical aceitação, todo ele feito de humildade e de
fé, operou-se logo em seguida a concepção do Verbo Encarnado no seu
seio virginal. Consideremos agora um aspecto particularmente comovedor desse fiat.
O
Verbo de Deus foi gerado pelo Pai desde toda a eternidade.
Conhecendo-Se a Si mesmo, Ele gerou um Filho eterno sem concurso de mãe
alguma, de uma forma misteriosa que nossa inteligência não consegue
compreender. Ora, logo após o
consentimento da Virgem - "Eis aqui a serva do Senhor, faça-se em Mim
segundo a tua palavra" -, o Espírito Santo iniciou n'Ela o processo de
gestação do Verbo Encarnado. Ela tornou-Se Mãe sem concurso de pai
natural.
Há,
pois, entre o Padre Eterno e Maria Santíssima um paralelo de
impressionante grandeza: ao considerar suas próprias magnificências,
Este gera o Filho na eternidade; e Maria, pondo nas mãos de Deus sua
própria contingência, gera o Filho de Deus no tempo!
Por
ser a mais humilde de todas as criaturas, Nossa Senhora reproduz de
algum modo a geração do Verbo na eternidade, ao dar origem na Terra à
natureza humana de Nosso Senhor. O Pai criou todas as coisas no Verbo e
pelo Verbo; pela Encarnação, Maria vai permitir ao Filho oferecer-Se em
sacrifício ao Pai, para a recuperação de todas as coisas degradadas pelo
pecado.18
O grandioso plano da Encarnação e da Redenção do gênero humano esteve na dependência desse fiat de Maria, porque se, por uma hipótese absurda, Ela não tivesse aceitado, não teria havido a Redenção.
O grandioso plano da Encarnação e da Redenção do gênero humano esteve na dependência desse fiat de Maria, porque se, por uma hipótese absurda, Ela não tivesse aceitado, não teria havido a Redenção.
Como
vimos no início deste artigo, Deus escolheu, entre infinitas
possibilidades, criar o melhor dos universos, no qual tudo se ajusta em
função de Nosso Senhor Jesus Cristo. Porque se Ele tivesse criado todos
os seres no seu grau máximo de perfeição surgiria, paradoxalmente, uma
tremenda deficiência, maior do que qualquer outra que possamos conceber:
a do Verbo Encarnado não poder oferecer nada de Si para tornar mais
elevada a Criação.
Devemos,
portanto, nos alegrar com as nossas limitações e, em certo sentido, até
com nossos pecados, pois eles permitem a Nosso Senhor exercer a
misericórdia, derramando sobre nós, por meio de Maria Santíssima, aquilo
que n'Ele existe em plenitude absoluta.
Porém,
a fecundidade do Preciosíssimo Sangue de Jesus é tal que, ao reparar e
perdoar, Ele não só nos restaura aquilo que perdemos, mas nos traz um
complemento, dando-nos ainda mais do que anteriormente possuíamos. Dessa
maneira, podemos alcançar, pela graça divina, aquilo que os seres mais
perfeitos, se fossem criados, teriam por natureza.
Ora,
foi a Virgem Maria, com sua disponibilidade e obediência, quem
introduziu no cerne da Obra divina a Criatura cume e modelo arquetípico
de tudo quanto existe, da Qual tudo deflui. Por isso, a Solenidade da
Anunciação do Senhor celebra a restauração da harmonia no universo. É a
comemoração do dia em que a Criação passou a transluzir com um brilho
todo divino, pelos méritos de Maria Santíssima. (Monsenhor João Clá
Dias, EP)
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