Por Cássia Thaís Costa Dias de Arruda
Um dos modos de medirmos a grandeza de
um soberano é considerarmos os seus títulos. Por exemplo, Luís II de
Bourbon, o Grand Condé, contemporâneo de Luís XIV, foi uma das grandes
glórias do reino francês, sendo possuidor dos seguintes títulos:
"príncipe de Condé, primeiro príncipe de sangue real, primeiro par de
França, duque d'Enghien, de Bourbonnais, de Châteauroux, de Montmorency,
cavaleiro das Ordens do Rei, governador da Borgonha e de Bresse".1
Podemos, através destas qualificações, constatar como o Grande Condé não
era uma pessoa insignificante no reino da França.
Se assim é com um nobre, muito mais
ainda o será com a Mãe de Deus. Aureolada de incontáveis títulos que
tentam expressar as qualidades de sua alma, de Maria Santíssima "nunquam
satis"2; d'Ela nunca será dito o suficiente, nem se esgotarão os
louvores que lhe são devidos. Dentre as diversas invocações atribuídas à
Santíssima Virgem, trataremos neste artigo, de maneira especial,
daquela que é de fundamental importância para a nossa salvação:
Medianeira Universal de todas as graças.
Maria Santíssima: "Medianeira não necessária, mas desejada pela Providência"3
Ensina-nos o Doutor Angélico que o
ofício de mediador entre Deus e os homens consiste em uni-los.4Desta
forma, este ofício só pode atribuir-se de modo perfeito e absoluto a
Nosso Senhor Jesus Cristo, "o único que nos pôde reconciliar com o Padre
Eterno oferecendo-lhe, por toda a humanidade, um sacrifício de valor
infinito, o da Cruz. [...] Ele é mediador como homem, na qualidade de
sua humanidade pessoalmente unida ao Verbo, e tendo ela recebido a
plenitude da graça, a graça capital, que deve derramar-se sobre nós".5
Apesar disso, abaixo de Deus existem os
chamados "mediadores secundários" (secundum quid), que dispõem os homens
a receberem as influências que dimanam do mediador supremo - Cristo -
ou, por vezes, são eles mesmos que as distribuem, em função dos méritos
do Redentor. Deste modo, agiram os profetas e os sacerdotes levitas do
Antigo Testamento, bem como os sacerdotes de todos os séculos, na
qualidade de ministros do mediador principal.6
Entretanto, no que diz respeito à
mediação de Nossa Senhora, "ela não o é precisamente na qualidade de
ministro, mas como associada à obra redentora de seu Filho".7Tendo sido
por ela que Deus enviou seu Filho ao mundo para redimir o gênero humano,
é também por meio da Mãe de Cristo que Deus continua a distribuir o seu
perdão e a sua misericórdia. "De tal maneira ela cooperou com toda a
obra da redenção, e de tal forma que, depois do pecado original, nenhuma
graça nos vem sem seu influxo".8
Já desde os primeiros séculos do
cristianismo, a Tradição Apostólica reconhece Maria Santíssima como
medianeira entre Deus e os homens. Se, por exemplo, nos detivermos para
analisar os ícones mais antigos existentes na Igreja, constataremos que
eles, em sua grande maioria, apresentam a Santíssima Virgem com o seu
Divino Filho nos braços. Tais imagens simbolizam que Maria, sendo Mãe de
Deus, tornou-se Senhora de toda a criação, e "enquanto Mãe de Deus, sua
súplica é governativa por vontade de Deus".9
A mediação de Maria é, portanto, uma
mediação subordinada à do Salvador. Não é de caráter estritamente
necessário - uma vez que a de Nosso Senhor Jesus Cristo é absoluta e não
precisa de complemento - mas "desejada pela providência, como o mais
excelente fulgor da mediação de Cristo".10
Desta forma, é absolutamente lícito e de
acordo com a doutrina da Igreja afirmar que, por vontade de Deus,
nenhuma graça trazida por Cristo com a sua Redenção - nihil prorsus - é
comunicada aos homens sem o intermédio de Maria.11A este respeito, nos
assegura São Bernardino de Sena que "todas as graças que são concedidas
ao mundo percorrem este caminho: de Deus descem para Cristo, de Cristo
descem para a Virgem e, finalmente, pela Virgem, em uma ordem admirável,
são distribuídas entre nós".12
Sendo Cristo cabeça da Igreja, a piedade
cristã costuma figurar Maria como sendo o pescoço, pois "todos os dons,
todas as graças, todos os influxos celestiais procedem de Cristo, como
da cabeça, e passam por Maria, como pelo pescoço, ao corpo da
Igreja".13Assim como o corpo não pode receber nenhum comando da cabeça,
sem que este antes passe pelo pescoço, de igual modo, nenhuma graça é
recebida de Cristo sem o auxílio de Maria.
Reconhecida de tal modo pela piedade
cristã, a ordem das coisas faz com que também seja por meio de Nossa
Senhora que as súplicas da humanidade subam até o trono do Altíssimo,
pois "o termo ‘mediação', ou ‘medianeira', além de convir à distribuição
de todas as graças [...], convém também, e sobretudo, à obtenção de
todas as graças".14
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